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País rico é país sem polícia

Éllcio Ricardo

Psicólogo, Diretor de Projetos de IPJ

Foto: everystockphoto.com

Assistimos há alguns dias um curta metragem do seguinte cenário: motos sendo aprendidas, adolescentes sendo proibidos de transitar em suas potentes motocas Shineray, os pais respondendo TCO, e uma enxurrada de multas prescritas pelos Policiais Militares para os motoqueiros que pilotam de sandália, estão com carteira de habilitação atrasada ou pessoas que estão sem o cinto de segurança. Ressaltando que esta atitude deveria ser tomada pela Secretaria de Defesa Social do Município, visto que o trânsito agora é municipalizado e não compete a Polícia se envolver com esta ação. Parece-me que a “denúncia” realizada pelo Exmo. Juiz de Direito Ivan Alves de Barros[1] surtiu algum efeito. Quem agradece é o Governo do Estado que agora arrecada milhares com esta brilhante atuação dos defensores da inviolabilidade humana. Antes, o que víamos eram as pequenas propinas, o café e o guaraná que não mais fazem parte da rotina policial dos ilustres representantes do estado (pelo menos eu acho).

 

“Enquanto isso “na sala de justiça” traficantes e criminosos, assaltantes e estupradores[2] planejam suas fascinantes atuações.

 

A violência não é uma realidade presente apenas nos grandes centros urbanos. Vemos diariamente noticiários que retratam as covardias, os assaltos e crimes de toda ordem que as ações policiais não têm dado conta de remediar. Em nossa cidade não é diferente, basta que entrevistemos alguns adolescentes e logo colheremos relato de que foram vítimas ao menos de um assalto.

 

Alguns dizem que a violência está ligada a pobreza, que o enfrentamento das injustiças sociais traria a paz ao reino terrestre. E eu vos pergunto caros leitores, e as mortes realizadas por policiais que assumiram com a sociedade um Pacto Pela Vida?

 

Estamos saturados de ver e ouvir as atrocidades cometidas por PMs que ao invés de defenderem a vida e a garantia de direitos são os primeiros a violá-la. Vamos lembrar alguns fatos:

 

  • O policial militar Pascoal dos Santos Lima é acusado de matar o dono de duas farmácias nas zona sul de São Paulo. Outras 16 mortes são atribuídas ao PM, incluindo o assassinato do coronel José Hermínio Rodrigues, em janeiro de 2008[3];

  • Soldado da Polícia Militar (PM) Lynael Rodrigues Plácido, 23 anos, foi preso na tarde desta terça-feira (3), após atirar nas costas do autônomo Agno Júnior Brito, 27. O crime ocorreu na Rua A-5 do bairro Japiim 2, zona sul de Manaus[4];

  • Um coronel reformado da Polícia Militar da Paraíba baleou dois jovens na tarde deste domingo (29) no Bairro dos Estados, em João Pessoa. Ainda de acordo com a Delegacia de Homicídios, o coronel estava apresentando sinais de embriaguez[5];

  • O massacre de Teresina: PM atira contra estudantes a sangre frio. Mais uma barbaridade cometida pela Polícia Militar, dessa vez no Piauí. Apenas eram estudantes num protesto pacífico contra o aumento das passagens de ônibus[6];

  • Quem não lembra o caso de João Roberto que a todos comoveu quando seu pai apareceu indignado, revoltado, altamente amargurado, nos programas televisivos, que aos três anos de idade foi baleado dentro do carro da mãe, na noite do dia 6 de julho de 2008, no Rio de Janeiro. Os policiais disseram, na época, que teriam confundido o carro de Alessandra com o carro de criminosos que estavam perseguindo e atiraram.

  • Em janeiro de 2011, foi a vez dos policiais do Grupo de Ações Táticas Especiais (GATI) cometerem seus delitos na cidade de Orobó quando atiram em dois adolescentes que estavam em um carro estacionado nas imediações do sítio Caraúbas. Eles disseram que confundiram com assaltantes e atitaram com fuzis 762 (e não atiraram para matar).

 

E assim segue na internet milhares de notícias deste gênero. Fico pensado nos casos que não são noticiados, porque são vítimas, adolescentes e jovens em sua maioria, filhos da miserabilidade e do anonimato da pobreza, que ninguém noticia porque não dá audiência, porque são sujeitos envolvidos com drogas e merecem morrer mesmo ou porque os segregados não têm direito sequer a misericórdia.

 

A Polícia Militar está a serviço do estado como multiplicadora do exercício da cidadania e não da perfídia ultrajante. Atiramos pedras pontiagudas naqueles que estão à margem, os marginais, e esquecemos que eles também são vítimas da ausência do Estado, portanto, quando o cérebro de um governo está envenenado, os corações dos governados padecem da mesma peçonha.

 

Deste modo, começo a pensar que e verdadeira pobreza não está no fogão sem lume, no armário vazio ou na caçarola queimada do fogo de lenha. A verdadeira pobreza é a hediondez dos crimes, das mortes, dos assédios morais praticados por policiais, na expressão da perversidade selvagem retratando a miserabilidade da classe mais corrupta do Brasil. Quem assistiu Tropa de Elite tem a perfeita compreensão do que estou falando. Policiais degenerados alimentando um sistema mafioso muito bem montado para saquear todas as possibilidades de dignidade humana. Esta realidade não é privilégio dos morros cariocas tendo em vista que a polícia foi apontada por escoltar a droga que chegava em Surubim.

 

Caso violência seja expressão da pobreza, um caminho possível para um país rico seria inventar outra classe de profissionais que não tenham o caráter de polícia. E esta invenção implicaria toda uma mudança de práticas. Construir uma nova epistemologia para uma classe que represente o Estado na legitimidade da garantia de direitos e no enriquecimento da democracia.

 

Temo que esta realidade esteja pairando em Surubim. Muitas vezes tenho a sensação de estar caminhando nas ruas em plena insegurança, mesmo na presença dos que se dizem representantes da lei.

 

Em que cidade estamos vivendo onde as autoridades não mais exercem a representação simbólica da lei, pois vemos constantemente, policiais militares pilotando sem capacete e levando em sua garupa duas pessoas, porque nunca vão ser multados; guardas de trânsito que são flagrados embriagados dirigindo e dão a desculpa de que “é minha folga” e esquecem-se que não há na lei qualquer artigo que o autorize a colocar em risco sua vida e a vida de outras pessoas mesmo que seja guarda de trânsito, pelo contrário ele deveria ser o primeiro a exemplificar o que sabe, porque não tem privilégio, o prefeito envolvido em escândalos de corrupção, o ministério público com suspeitas de omissão e assim segue a construção da ordem, ou da desordem.!

O que mais me inquieta é esta idéia de prático poder (não é falso poder porque existe, e também não é legítimo) que paira no imaginário dos representantes do estado, eles podem ser violadores, porque não serão punidos pelas atrocidades que cometem. A sensação é que voltamos aos tempos de barbárie e que a civilização não é senão uma selvageria tecnológica que a todos oprime, salvo os privilegiados.

 

 


 

[1] Entrevista disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=EgbXlFb60YQ

 

[2] Acho estas palavras muito estigmatizadoras.

 

[3] http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2012/02/promotor-diz-que-jurados-podem-ter-se-intimidado-em-julgamento-de-pm.html

 

[4] http://www.d24am.com/noticias/amazonas/pm-atira-em-rapaz-desarmado-por-ciumes-da-noiva/46362

 

[5] http://g1.globo.com/paraiba/noticia/2012/01/coronel-reformado-da-pm-atira-em-dois-jovens-em-bairro-de-joao-pessoa.html

 

[6] http://jornalaico.blogspot.com/2012/01/o-massacre-de-teresina-pm-atira-contra.html

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